Desculpa por te escrever essa carta depois de
tanto tempo, não foi fácil durante uns anos. Alguns dias eu só queria ficar
bêbado escutando Bon Iver. Mas, eu hoje lembrei do teu aniversário e do quanto
você ainda gosta de receber parabéns (porque certas coisas nunca mudam, eu
sei). Além disso, certa vez você me disse gostar dos meus textos, eles só
deviam não sofrer tanto. Você dizia isso vestindo uma camisa escrita “ Love
will tear us apart”, vê se pode? A tristeza sempre foi nosso segredo em comum,
Honey baby.
Quando nos conhecemos éramos tão jovens, darling,
e eu era mais imaturo do que julgava ser. Você me ensinou tantas coisas que eu
nunca agradeci, como a tua liberdade, como umas músicas do Red Hot que
até hoje eu canto, Frusciante não ser teu sobrenome e a letra de Miss Sarajevo.
Essa última parte eu nunca disse, não é? Eu escutava U2 só para te
impressionar.
Não sei se eu sou o chato que não te supera e
volta chamando teu nome ou se realmente algo que nos transcende nos une com
força tamanha, não obstante nossos destinos diametralmente opostos. Há um certo
laço entra a gente desde aquele dia quando você, inocentemente, me ensinou a
fumar. Às vezes é como se ainda estivéssemos na varanda dividindo um Dunhill, o
spotify tocando Come
Pick Me Up e a toalha secando o teu cabelo recentemente pintado de
vermelho ou cor de girassol.
São teus novos 20 e poucos anos de vida, dos
quais alguns compartilhamos. E apesar de tudo eu sei que ainda estou em algum
esconderijo que você fez, onde eu não podia entrar, mas você só me avisou tarde
demais. Um lugar de ti onde só nós dois sabemos, onde nós ainda existimos. Duas
estrelas, comprometidas com o infinito.
Foi bom te encontrar e me apaixonar, desentender,
voltar, discutir Lars von Trier em um quarto de motel fumando maconha, sumir,
chorar. O mundo é mau, minha Justine, mas a verdade é que eu nunca soube te
odiar. Muito menos nossas escolhas. Eu só odeio DogVille e o governo Michel
Temer.
Eu queria ter lições de vida para te contar, mas
acontece que eu ainda continuo errando tanto, Honey. A vida adulta é tão dura
às vezes que “quanto mais eu escuto o Axl cantar “Don’t cry tonight”, mais eu
tenho vontade de chorar”, como você costumava dizer. Para você também tem dias
que são impossíveis, eu sei. E por mais que a
tragédia seja um país estrangeiro no qual não se sabe o que dizer aos nativos - como
eu aprendi naquele filme -, estamos no mesmo barco e ele ainda flutua. Não se
entregue nunca, Darling, porque em você There’s
a light that never goes out.
Nós mudamos muito desde que você deixou a luz do
sol entrar na minha vida e eu cantei Beatles para ti, mesmo você dizendo que
odiava. Eu mudei de endereço, perdi o medo do escuro e comecei a ler Sartre; eu
me apaixonei de novo e sei que você se apaixonou também. Eu juro que me sinto
feliz por isso, assim como eu juro que tentei ver Mulholland Drive, mas eu
dormi.
Eu sei, honey, que as nossas vidas se opuseram de
tal forma que, certamente, não daríamos mais certo juntos, mas ainda
trocaríamos mil conversas até o sol nascer. Você ainda conhece tantas músicas
legais que eu ainda nem ouvi falar, tal qual eu inventei algumas outras canções
que você acharia bem meia boca, mas ouviria até o final.
Sabe, eu nunca esqueci tua voz que ainda soa como
um gol, no rádio, do time preferido aos 48 do segundo tempo em final de
campeonato, do teu corpo branco onde eu deitaria um beijo em cada centímetro,
da tua meia calça preta — que eu nem sei se ainda existe -, dos teus olhos
claros, unhas longas, mamilos rosados e a franja malfeita. Nossas digitais não
se apagam das vidas que tocamos. As tuas ainda estão guardadas por aqui, onde
ninguém pode ver, mas onde você sabe que as deixou. Aliás, recentemente comprei
um retrato de uma pintura chamada Danaë (do Klimt), porque achei tua cara. Eu a
pendurei na parede atrás do notebook. Ela me lembra você dormindo e da
imensidão do amor que sentíamos quando tão fragilmente expostos.
E é assim que eu te desejo Parabéns! E me
orgulho, de alguma forma, pelo o que você se tornou, por você ser tão sua.
Todavia, eu sei que ainda há eu em ti também, guardado.
Tu mereces esses anos e os outros milhares de
anos que virão, e que você continue linda de frente, verso e avesso, como és.
Some girl are Bigger than Others, baby, e você é a maior que eu já conheci. Eu
amo a pessoa que você é, não esquece, ok?
Feliz Aniversário, Olga
J.
P.S: To te mandando uma cópia do retrato que eu
falei.
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